Pedro Cardoso (Peixe) nasceu a 12 de Fevereiro de 1974 na cidade do Porto. Estudou Guitarra clássica no Conservatório de Música do Porto, guitarra Jazz na Escola Superior de Música e Artes do Espetáculo (ESMAE) e pintura na Faculdade de Belas Artes do Porto (FBAUP). Foi guitarrista da banda Ornatos Violeta, hoje considerada uma das mais importantes bandas portuguesas de sempre e que marcou de forma incontornável, a chamada “música moderna portuguesa”. Com os Ornatos editou os álbuns Cão! (1997) e O Monstro Precisa de Amigos (1999).

Em 2002, após a separação dos Ornatos, formou a banda de rock Pluto e a banda de jazz DEP, editando em 2004 os álbuns Bom Dia e esquece tudo o que aprendeste.
2010 foi o ano da edição de Joyce Alive com o grupo Zelig e mais tarde em 2012 de Apneia, o seu primeiro álbum a solo.
Foi também o criador da OGBE (Orquestra de Guitarras e Baixos Elétricos), projeto que dirige e que conta com o apoio do serviço educativo da Casa da Música, com quem colabora regularmente quer como formador quer como músico.
Durante o seu percurso musical, colaborou com vários músicos e agrupamentos, tais como: Dead Combo, Drumming, Remix Ensemble, Carlos Bica, Maria João, Joana Sá, Adrien Utley, John Ventimiglia, Perico Sambeat e David Fonseca entre outros.
Ao lado do Teatro Bruto e da encenadora Ana Luena, colaborou na criação do concerto encenado Still Frank e assinou a banda sonora da peça Estocolmo de Daniel Jonas e também de Comida, O filho de mil homens e O amor dos infelizes de Valter Hugo Mãe. Para cinema criou com o grupo Zelig a banda sonora de O universo de Mya de Miguel Clara Vasconcelos e o filme-concerto Bucking Broadway de John Ford, encomenda do festival de curtas-metragens de Vila do Conde.
Como compositor para outros intérpretes, escreveu a peça Três Histórias (para guitarra elétrica e percussão) para o grupo Drumming e em parceria com a compositora Ângela da Ponte criou a peça Despique para três bandas filarmónicas.
Motor é o seu segundo registo a solo, com data de edição a 9 de Março de 2015.

Peixe a Motor

"A desagregação de um conjunto leva inevitavelmente a um tipo de centrifugação estilhaçante, onde os fragmentos são um produto da irradiação de uma sinergia anterior agregadora de uma totalidade homogénea. Isto acontece freneticamente no mundo da música quando partes decidem pôr termo a um corpo, formando novos corpos à parte.

O caminho de Peixe, um dos mais notáveis guitarristas portugueses da actualidade, é assim um caminho de deriva e diáspora, próprio de artistas em nome próprio que se vão afastando da carruagem do conjunto. Para trás, e para lá dos já míticos Ornatos Violeta, Peixe deixa colaborações com os Pluto, Zelig, DEP e a Orquestra de Guitarras e Baixos Eléctricos.

Essa empresa unipessoal começou o seu percurso com Apneia (2012), o seu primeiro álbum a solo e imerecidamente votado a uma certa apneia crítica. Um título apto para quem responde pelo nom de plume de Peixe, apontando para uma suspensão de fôlego metálica a partir de uma técnica de nylon, deixava entrever uma matriz clássica numa entrega paisagisticamente ácida. Esta via totalmente instrumental estende-se agora a Motor, o sucessor ou retomador da linha de continuidade acústica adivinhada no seu primeiro esforço.

Com Motor, e apesar da relativa surpresa do nome, convocando desde logo um certo temor pela motosserra musical onde o virtuosismo se agrilhoa na monotonia motorizada das capacidades espúrias do seu executante e aliena integralmente o seu escutador, Peixe nada aparentemente não tanto em rodas dentadas ou pistões de virtuosismo, mas, e não obstante ser um virtuoso, em máquinas orgânicas mais ambientais, diria blocos de corais embebidos em líquido amniótico. A sua identidade é ambiental. O problema com este tipo de qualificação é a sua temível relação com elevadores e outros espaços de espera e de suspensão de tempo não propriamente apreciados por músicos de assinatura. Motor, apesar de prolongar a apneia através da contínua suspensão da respiração por via da prótese da guitarra, e desse ponto de vista levar a uma respiração motorizada, não se reduz a uma agregação de sons mais ou menos inteligentes para preencher espaços, nem tampouco de um passatempo egotista de um virtuoso. É antes um tempo para habitar um espaço. A sua audição repetida convoca, aliás, o princípio do prazer que só a repetição oferece sem a sensação de dèjá-écouté, apesar de várias faixas repetirem internamente esse equilíbrio de prazer através da reiteração de frases. Este mosaico constitui um tipo de Aranjuez da lezíria, onde uma fulgurante espacialidade se alia à minúcia da nota certa, como se Peixe fosse uma espécie de recolector de cerejas na guitarra. Sem procurar impor-se ao escutador, Motor, longe do ruído monotonal da máquina, é à uma recém-conhecido, amigo do utilizador e companheiro de alma. Aliás, o carácter contrastivo do seu título com a slow-food que nos é servida é também visível na capa do disco (como se Paula Rego tivesse pintado Os Comedores de Batatas).

A dificuldade em alijar a mera pirotecnia da execução, a qual, por mais respeitável que seja enquanto actividade de ginasta, deixa poucos espaços para serem preenchidos pelo escutador, em nome da composição e da beleza harmónica do conjunto, é um atributo dos melhores. A improvisação aliada à repetição de blocos estruturantes faz de Motor um disco fundamentalmente coeso, em que a guitarra, à uma melíflua e precisa, sugere, no seu dedilhar de grandes espaços, uma decantação vibrátil de regato percutindo um travelling de arpejos e visitando lugares de excepção, entre os quais “lamento imenso” ou “improvisação #22”, apesar de aqui e ali desertar uma certa hipnose do conjunto em favor da inclusão da resonator e da flauta transversal que convocam a polivalência de composição de Peixe, especificamente na escrita para teatro.

No mapa português tem sido tão admirável quanto surpreendente uma certa garimpagem recente no domínio da guitarra acústica. Há repentinamente um punhado de nomes que desafiando a rarefeita tradição acústica portuguesa (excepção feita, evidentemente, à guitarra portuguesa) tem desenhado um percurso admirável de técnica e inovação. Se quisermos dedicar-nos ao exercício de arranjar uma mancheia de guitarristas de assinatura, não é possível excluirmos Peixe deste lote que não é nenhum cardume. E Motor é certamente um disco que não pode permanecer em apneia auditiva."

Daniel Jonas

©2015 Turbina
Todos os temas compostos por Peixe
Gravado, misturado e masterizado por Nuno Mendes
Peixe: guitarra acústica
Nuno Tricot: flauta transversal em "Valsa do Cowboy Enamorado" e "Valsa Judia"
"Valsa do Cowboy Enamorado" foi composta para o filme concerto Bucking Broadway por Zelig.
Ilustração por Ana Torre (www.anatorre.tumblr.com)
Design gráfico por João Sobral (www.joaosobral.pt)

1. acordar 3:13)
2. 20 piscinas (1:59)
3. até os velhos (3:37)

4. motor (2:18)
5. lamento imenso (2:38)
6. locomotiva (1:47)
7. valsa do cowboy enamorado (1:57)
8. suite (6:41)
9. despassarado (2:02)
10. valsa judia (1:38)
11. dengosa (3:02)
12. improvisação #22 (3:32)
13. melodia simples (2:10)
14. improvisação no corredor (3:44)