Os Imparáveis Tiroliro & Vladimir é um CD editado no dia 21 de Janeiro, reunindo um reportório perdido e inédito - anterior ao fenómeno do "rock português" - criado por Gimba e Jorge Galvão ainda nos anos 70, quando ambos eram ainda teenagers. Por volta de 1985, quando se lhes junta o baixista Nuno Faria, o grupo passaria a chamar-se Os Afonsinhos do Condado.
1º single
"Onde Foste Tu?" é uma composição de 1978 que reflete alguma inocência adolescente, numa atitude contestatária em relação ao que estava (e continua a estar!) instaurado. Um manifesto ainda com reminiscências hippies, mas também na corrente em voga na altura: o punk. Não será por acaso que, antes do seu nome "oficial", a dupla Tiroliro & Vladimir era designada pelos amigos por "Country Punk". Se a consciência ecológica da canção - e a própria ecologia em si - ainda não era coisa madura em finais de 70 - o tema chega a 2021 tresandando a actualidade, e apontando o dedo - se não as armas - aos senhores do mundo e, no final de contas, à nossa própria consciência, em nome de um futuro melhor. Vamos - todos - continuar a insistir nos mesmos erros? O tema foi escrito pelo Jorge Galvão durante a separação da dupla, devida ao "exílio" americano do Gimba (que foi viver uns tempos para o Texas). Após uma intro que engana o ouvinte, levando-o a pensar que se trata de uma canção "celta", logo o instrumental explode para um rock de barba dura, num compasso não binário, ele próprio "desalinhado" com os padrões estabelecidos.
2º single
Depois do inconfundível “Onde Foste Tu?”, primeiro avanço do álbum, eis que chega o segundo single “As Pessoas da Vila”. Tendo por mote uma das reflexões mais antigas da humanidade - A vida não é só pão! - esta canção é um verdadeiro hino ao lazer. Assim, numa pequena vila, metáfora do mundo inteiro em que andamos sempre a correr, a pobre personagem “João”, que apenas passeia pela praia e, na verdade, não liga a nada, acaba por ver recompensada a sua teimosa mas proveitosa preguiça.
Aqui está uma das primeiras canções - se não a primeira - da jovem dupla. Em compasso rápido, com influências da folk acústica de Paul Simon ou Lennon/ McCartney, esta é uma história naïf com final feliz, acabando o mundo (a vila) em clima de paz e amor. É um dos melhores exemplos da ingenuidade contida em algumas letras do álbum, dada a tenra idade dos autores. É também uma das marcas do som acústico do duo, com vozes e assobiadelas misturadas em alegres harmonias, acompanhadas pelas duas guitarras freneticamente dedilhadas. Nesta versão é possível ouvir o contrabaixo do convidado Francisco Silva, bem como as vozes de Inês Santos e Pedro Lopes, replicando um Vai-te embora, vadio! gritado pela populaça ainda enfurecida. O vídeoclip, realizado pela dupla neozelandesa G&G, já corre nos écrans habituais.
Este disco resulta de um curioso trabalho de arqueologia cerebral, pois não existia nenhum registo destas canções. Todas as cassetes gravadas na altura, entre as quais a do seu primeiro concerto (o “Full Moon Concert”, a 20 de Julho de 1978, em Lagos, abrindo para a Go Graal Blues Band, de Paulo Gonzo) desapareceram com o tempo, bem como quaisquer blocos ou cadernos com letras escritas. A (boa) memória dos dois conseguiu recuperar vinte e duas dessas canções, dezoito das quais integram o CD.
Se do lado da composição musical se nota já uma certa maturidade, resultante de várias influências da época (da canção de intervenção ao rock progressivo ou ao punk), é óbvia, do ponto de vista lírico, alguma ingenuidade típica da idade (os rapazes eram ainda teenagers...), com referências a amores de liceu ou a um mundo idílico da paz e amor. Curiosamente, algumas ideias aguentaram bem o hiato temporal, resultando em temáticas super actuais, como a visão de uma ciclovia em pleno Cais do Sodré (Domingo em Bicicleta), o incontornável stress da vida moderna (As Pessoas da Vila), ou este “Onde Foste Tu?”, que acaba sendo uma reflexão ecológica e uma chamada de atenção para a destruição do planeta.
“Os Imparáveis” foi produzido, gravado e misturado pelos dois autores e conta com a participação de alguns amigos - desde logo o próprio Nuno Faria, no contrabaixo - Gui (Xutos e Pontapés), nos saxofones, ou Paulo Marinho (Sétima Legião/Gaiteiros de Lisboa), que toca as inconfundíveis gaitas de foles no início deste single, cujo videoclip foi realizado por Jorge Galvão. Fausto Ferreira (piano eléctrico), Luís Gaspar (Bateria), Nuno Reis (Trompete), Franciso Silva (contrabaixo), Pedro Lopes, Inês Santos e Violeta Galvão (vozes adicionais) completam o naipe de artistas convidados.
Disponível em streaming e em CD, o disco Os Imparáveis Tiroliro & Vladimir já está nos escaparates habituais, analógicos ou digitais.
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Este punhado de canções remonta aos tempos do pós 25 de Abril e ao flash de liberdade que iluminou de mil cores um Portugal até então a preto e branco.
Os jovens Gimba e Jorge Galvão conhecem-se em 1976/77 na escola António Arroio, sempre de guitarra a tiracolo, sempre harmonizando as suas vozes, primeiro com os Beatles e logo com as suas próprias composições. Quando, em Julho de 1978, são convidados a abrir o "Concerto da Lua Cheia", em Lagos, o duo ainda nem tem nome! (amigos chamavam-lhes "Country Punk") Mas, no verão seguinte, no mesmo concerto, já são anunciados como Tiroliro&Vladimir.
Anos mais tarde, depois de muitas noites cantando em muitos bares de Lisboa, junta-se-lhes o contrabaixista Nuno Faria e, em 1986 o trio chama-se Os Afonsinhos do Condado. O seu novo repertório chegará aos discos e ao grande público, deixando para trás estas músicas da duplas, quase todas escritas ainda nos anos 70! Contemporâneo de nomes como Corpo Diplomático, Beatnicks ou Tantra, este espólio constitui um importante testemunho da pré-história do "Rock Português".
Gimba: guitarras, teclas, percussões e vozes
Jorge Galvão: guitarra 12 cordas, percussões e vozes
Luís Gaspar: bateria (A Americana)
Nuno Faria: contrabaixo (A Americana, Gosto Muito Mais)
Gui: saxofones (A Americana, Sempre Mais Perto do Ar)
Nuno Reis: trompete (A Americana, Sempre Mais Perto do Ar)
Francisco Silva: contrabaixo (As Pessoas da Vila)
Fausto Ferreira: piano eléctrico (Sr. Jazz)
Paulo Marinho: gaitas de foles (Onde Foste Tu?)
Pedro Lopes, Inês Santos, Violeta Galvão: vozes adicionais
Edição apoiada pelo fundo cultural da SPA
Produzido por Jorge Galvão e Gimba
Gravado e misturado entre 2018 e 2021 no M.E.M. - Melhor Estúdio do Mundo - Lisboa
Gravações adicionais em Montemor-o-Novo e no Arco do Cego
Masterizado por Carlos Jorge Vales nos estúdios Auditiv
Lado A:
1. A Americana (4:58)
Delírio verbal nascido na sala de Jorge Galvão em fim de década (de 70). Antes disso, durante muito tempo não passou de uma melodia assobiada para uns supostos trompetes, aqui replicados pelos fabulosos "Irmãos Spaghetti"...
2. Hoje é o Dia (3:19)
A única canção "pública" desta colecção, pois chegou a disco ("Açúcar!") com os Afonsinhos do Condado, é o reflexo da vivência canábica da rapaziada (daí o seu andamento planante...), que achou graça ao trocadilho "Ela é Judia/É Hoje o Dia". Daí a rimar "ano" com "germano" foi um passo.
3. Ela é Judia (0:30)
Reprise acelerada da canção anterior, criada já em pleno ano de 2017.
4. As Pessoas da Vila (1:39)
Uma das primeiras pérolas de Jorge Galvão, e uma das primeiras composições a ser trabalhada pelo duo. Aguarela portuguesa sobre a frenética vida moderna - com um toque um tanto freak, é certo - mas tão ou mais actual que o melhor Eça!
5. Canto Masoquista (4:39)
Viagem eclética , da MPP ao blues e ao rock psicadélico, um dos primeiros "êxitos" da dupla, estrado ao vivo no "Full Moon Concert" em Lagos (Julho de 1978) - a aventura dos dois rapazes, que passaram uma semana louca no Algarve, sem um tostão no bolso!
6. Domingo em Bicicleta (2:34)
Outra das pérolas de Jorge Galvão (Tiroliro), composta quando o seu colega Vladimir viveu por terras americanas, tema visionário sobre um romance açucarado surgido numa suposta ciclovia em pleno Cais do Sodré!
7. Eles (3:06)
Visão ácida e mordaz sobre a existência anormal dos americanos, particularmente a vizinhança de Gimba, quando este viveu no Texas (Dallas) no verão de 1978.
8. Ondek Tau Homem? (0:34)
Interlúdio a la Beatles, surgido em plena Praça José Fontana (onde era o TNT - Teatro do Nosso Tempo - poiso da rapaziada por volta de 1979/80), versão portuguesa de "Waiting For My Man"...
9. Sr. Jazz /
Composto em Junho de 1979, é uma homenagem à grande música negra, inspirada num imaginário "senhor jazz" - o homem capaz de improvisar "outra frase" no seu "piano electrónico". Por esta altura as vozes dos jovens "Tiroliros" estavam no seu pico de forma!
Noites de Verão (4:49)
Tema nascido nas falésias da Balaia no verão de 79, prontamente colado ao "Sr. Jazz", e estreado umas semanas depois, de regresso a Lagos, abrindo um concerto - tal como no ano anterior - para a Go Graal Blues Band de um tal Paulo Gonzo...
Lado B:
10. Onde Foste Tu? (3:08)
Rock raro, em compasso ternário, com uma entrada entre o progressivo e a world music, uma das músicas que marcou Gimba, acabadinho de chegar da América, na inesquecível sessão em que os dois mostraram um ao outro o que haviam composto durante o hiato.
11. Mariana (3:37)
Tema começado no equinócio primaveril de 1979 e acabado em 2020, traz recordações sobre uma manhã de nevoeiro na Arrábida e, mais recentemente, uma caminhada nocturna na Peninha, com "pirilampos na floresta".
12. Doce de Cereja (0:37)
Pequena amostra (35s) da canção que deu origem ao Macaquinho Nicolau (uma das primeiras músicas dos Afonsinhos), é um piparote nas convenções estereotipadas que ditam os parâmetros da estereofonia contemporânea.
13. Ninguém Sabe (3:28)
A canção mais ingénua do baralho. Rock do bom, sobre um amor platónico de liceu, amostra perfeita dos verdes anos da rapaziada...
14. Sereia (5:30)
"A" pérola de Jorge Galvão, revelada durante o memorável reencontro, canção com "cheiro a peixe", posteriormente trabalhada a dois e, indiscutivelmente, um dos grandes sucessos da jovem dupla.
15. Gosto Muito Mais (3:57)
Música veranil saída das dunas desertas da margem sul do Mira (Vila Nova de Milfontes - 1979) onde o jovem Gimba estava acampado ao relento, tendo composto a canção entre o acordar e o primeiro mergulho da madrugada.
16. Matemática (0:56)
Mais uma micro cançoneta, apostando no efeito fonético das aliterações, tão ao gosto de quem andava sob o efeito de Chico e Caetano.
17. Sempre Mais Perto do Ar (3:42)
Pequeno devaneio jazzy (que brotou numa simples ida a pé para casa) baseado na filosofia "Eu vou passando o meu dia-a-dia/Fazendo a vida melodia". É a canção mais recente do ramalhete (1983).
18. Canta (1:11)
Chave de ouro deste soneto, a fechar com a mensagem positiva do adágio "Quem canta, seus males espanta". Cinco minutos do tempo/E passa o tempo a cantar!