ENTREVISTA AOS PUZZLE
No mais comum dos dicionários a palavra "Puzzle" significaria: enigma, adivinha, confusão, (ou, mais popularmente "quebra-cabeças"). Para o nosso meio musical a "tradução" é diferente. "Puzzle" é nome para um grupo, de expressão musical bem comunicativa. Um grupo que afirma, peremptório: "São poucas as bandas como nós!" Por estas e por outras é que a TVG procurou decifrar o "Puzzle", em forma de entrevista. Este "Puzzle" é composto por três peças: o Fernando, viola baixo, o João, guitarra e o Pedro, na bateria e tem um single editado, o "Alfredo", estando já a preparar um LP, que sairá, muito provavelmente, e “para as coisas serem bem pensadas, em meados de 1982".
[Colocámos, a abrir o "frente a frente", a pergunta mais clássica que se pode fazer a uma banda musical portuguesa, na actualidade]
TVG - Será que os Puzzle são (mais) uma banda do chamado "rock português"? (A resposta, com ar chocado, foi espontânea)
Fernando - O rock português é uma mentira! A palavra rock é uma palavra inglesa e traduz determinada coisa. Em Portugal há várias "ondas". Por exemplo, uma que é o Heavy Metal (CTT, Roxigénio, NZZN e, aguentem a "barbaridade", os UHF!), Por outro lado, há o Rui Veloso, que é completamente diferente e ainda os “Táxi" ou os "Jáfumega". Nós, possivelmente, parecemo-nos mais com o Rui Veloso.
João - Rock português? O que me vem á cabeça é que o que existe em Portugal é rock feito por portugueses. Mas, o que é importante não é este ou aquele movimento mas a qualidade. É evidente que isso a que se chama o rock português tem tendência a acabar se não tiver qualidade, Com o tempo haverá, pois, uma selecção. Quanto ao "Puzzle" são raras as bandas como nós! Sempre tocámos juntos, eu, o Fernando e o Pedro [que não está presente]. Tocamos em grupo há sete anos. Fomos evoluindo todos, ao mesmo tempo. Nunca pensámos em termos de rock, mas em termos de música. A princípio nós éramos quatro "gajos", o Pedro, o baterista, tem um irmão que nessa altura tocava connosco. Depois ele foi para a Alemanha e continuámos os três.
TVG - "Alfredo/Quem Escorrega", é o vosso primeiro trabalho, o qual tem tido boa aceitação do público e da critica. Quais as condições em que ele apareceu, visto ter acontecido ao fim de sete anos de vida do "trio"?
Fernando -Tivemos oportunidade de gravar e gravámos. Sobretudo tivemos a colaboração de bons amigos: o Ramon Galarza foi o produtor. Gostámos muito de trabalhar com ele. Foi bestial, Por outro lado, houve também o Hugo Maia Loureiro, nosso vizinho, e amigo de há muito tempo, que nos apoiou sempre, que desenhou a capa do disco...
João - Um single é sempre uma limitação. De resto o single vende-se menos, tem tendência para acabar. O futuro (o nosso futuro como grupo e o futuro dos outros grupos) põe-se em termos de qualidade Há que pensar muito bem que tipo de trabalho vamos fazer, melodicamente, por exemplo. O ideal seria sermos milionários, não termos de trabalhar nem de estudar, [o João trabalha numa clínica, em educação física de reabilitação, e está a acabar o curso do Instituto Superior de Educação Física; o Fernando está em Letras e trabalha num escritório. enquanto o Pedro, o mais novo do grupo estuda no Colégio Alemão]. O termos possibilidades financeiras para nos dedicarmos em exclusivo à música seria excelente. Por agora o nosso desejo de realização em termos de grupo será gravar o LP e continuar (o que não há é necessidade de fazer um trabalho a correr, logo com menor qualidade) A música é um prazer lúdico, [à parte para o Fernando: Então. gostaste desta?] A música é algo que existe em nós A música dá-nos prazer e enquanto nos der prazer vamos continuar.
TVG - Uma falha, que se nota na actividade dos "Puzzle", é o pouco contacto que tem tido com o publico. poucas actuações ao vivo. Têm previsto maiores contactos de "estrada"?
Fernando - Em espectáculo há uma série de recursos técnicos que a maior parte dos grupos não utiliza, porque acha desnecessário. Três músicos, como é o nosso caso, para fazerem uma boa banda tem que recorrer a diversos suportes. Note-se bem, suportes e não truques! Porque esses suportes também são música. Ninguém duvida, por exemplo, que o trabalho dos "Police" é música, por exemplo. Nós gostamos muito do trabalho ao vivo (mesmo quando tocámos uma vez à beira da estrada, com "vista" para o cano de esgoto. Ali mesmo ao pé de nós).
TVG - Curiosamente na capa do vosso single não aparecem os nomes dos elementos do grupo: apenas o nome do grupo "Puzzle". As vossas letras, as vossas músicas nascem também de um empenhamento colectivo?
João - Exacto. Há letras, e há três "gajos" que contribuem para fazer as letras. E que contribuem. do mesmo modo, para fazer as músicas. Nós os três damo-nos muito bem quer a nível musical quer a nível pessoal. Parece-me que metendo mais um elemento no grupo ele transformar-se-ia completamente. O terceiro elemento do grupo, o Pedro, que não veio connosco, é um "gajo porreiro". É bastante bom na bateria, E é muito caladinho, é o nosso porta-voz", Quanto ao nosso single, "Alfredo" ele é um pouco mais do que aquilo que lhe chamam - tratam-no muitas vezes como "coisa suave e fresca" - somos os frescos! - não é um disco pretensioso. Trata-se antes de um trabalho de abordagem, mais ou menos simples, mais ou menos directo.
Aqui nos fica o registo do nosso contacto com o grupo "Puzzle", um grupo que faz música intencionando a qualidade, que afirma o seu trabalho como "não pretensioso" e recusa o rótulo de fácil. "Puzzle", um enigma agradável de resolver e conhecer.
ENTREVISTA DE JOSÉ ALEXANDRE HONRADO / TV GUIA 151 DEZ/1981